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terça-feira, 22 de junho de 2010

Ignorância sociolinguística

Recebi um “vídeo” que tenta manchar a imagem de uma pessoa pelo simples fato de ela não saber falar inglês.
Infelizmente a intolerância e o espírito de deboche permeiam a maior parte das mentes humanas, ao invés da reflexão e da busca de entendimento sobre certos fenômenos sociais.

A começar pelo título "Sua empregada fala inglês?", pode-se percebe que parece existir a necessidade de a empregada (doméstica, no caso) saber falar inglês.
Suponho que uma estrangeira (australiana) ligou para o Brasil, pois é pouco provável que a patroa tenha levado uma empregada brasileira, que não fala inglês, para o exterior.
Se a empregada não precisa saber inglês, o problema é da estrangeira. Se precisa, a patroa falhou na admissão!
Que tal uma outra pergunta para o começo do vídeo? Por exemplo: "Sua empregada brasileira, no Brasil, fala inglês?". Afinal, o contexto diz tudo!
Ou seja, quem produziu o "vídeo" se revela, no mínimo, preconceituoso e debochado.
Será que a estrangeira, que liga para o Brasil, sabe o básico, em português, para tornar seu telefonema eficaz?
Creio que prever situações desse tipo é o mínimo que um estrangeiro deve fazer, pois não se trata de ligar para uma empresa (que normalmente tem secretária bilingue).
O que você faria se ligasse para uma amiga no exterior e uma empregada atendesse falando alemão?
Creio que, por não ter obtido sucesso no começo da conversa, a australiana deveria ter desligado, aprendido 3 ou 4 frases em português e ligado novamente.
Simples, rápido e com mais chance de obter sucesso.

A entonação revela muito nesse caso.
A empregada é extremamente eficaz (profissionalmente) e totalmente competente (linguisticamente) ao responder a primeira pergunta. A pronúncia da australiana permite entender o nome da pessoa procurada e a entonação que ela dá permite entender que se trata de uma pergunta. Intuitivamente, a empregada responde o esperado.
É claro que as falhas de comunicação só aumentam desse ponto em diante. Por motivos óbvios.
Adequadas ou não, exatas ou não, coincidentes ou não, as perguntas são respondidas, as perguntas em inglês são respondidas em português. A troca de frases (que não cria um diálogo) se estende por compatibilidade conversacional: entonações próprias de perguntas e respostas progridem, mas a comunicação não se realiza.
O esforço pela compreensão mútua também é plausível, pois duas falantes tentam se entender falando idiomas diferentes.
Aliás, esse episódio só faz sentido para quem entende português e inglês. Imagine-se totalmente ignorante num dos idiomas, ou nos dois, e ouvido essa "conversa". Ela não fará o menor sentido.
Ao invés de se buscar conhecimento sobre os vários âmbitos que envolve essa cena e promover uma discussão sadia, muitos internautas preferem tentar difamar e fazer outros rirem de algo que não tem a menor graça.
É a eterna consequência da falta de conhecimento sobre o assunto e do pseudo-direito de julgar e condenar a partir da dualidade maniqueísta.

Abraço!